sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Nem isso Deus ignora

Há dias em que me conscientizo de, que, verdadeiramente, Deus pode todas as coisas, até mesmo aquelas que eu não ousaria determinar. Há horas em que me refugio na plena convicção de que Deus tem todo o poder. Trata-se de um pensamento absolutamente óbvio, mas que só me ocorre em situações especiais. Nesses momentos, invade-me a devoção, a contrição, e na seqüência dessa lembrança, prostro-me diante da sua soberania, pequenina e indecisa como formiguinha, na superfície de uma parede: não me movo com a lógica dos que conhecem a direção, mas com a fidelidade cega daqueles que, perdidos nas múltiplas possibilidades do caminho, experimentam uma estranha espécie de gravitação.

Essa força gravitacional Newton não explicou. Newton explicou que “a matéria atrai a matéria na razão direta de suas massas e na inversa do quadrado de suas distâncias.” Conclusão deveras importante para os físicos, para os matemáticos, para aqueles que se dedicam ao estudo dos astros, do Sol, dos Planetas, mas absolutamente sem relevância para mim, em circunstâncias nas quais só posso depender da mão divina. Na brecha dessa proposição, encontro ocasião para contemplar o gravímetro de Deus, pesando cada acontecimento de minha vida “na razão direta de seus planos e na inversa do quadrado de minhas decisões...” Parodiando Newton, vejo Deus exercendo sobre mim a gravidade de seus desígnios soberanos.

Um olhar atento sobre a história pessoal de cada personagem bíblico, confirma uma lógica orbicular encadeada, cumprindo propósitos bem maiores do que a mera satisfação dos desejos humanos. Em cada pequena ou grande citação bíblica, acerca dos personagens mais famosos ou mais obscuros, nota-se a obra de um Criador Inteligente, dispondo circunstâncias pessoais da maneira como convinha ao seu Plano Eterno. De maneira que, a nós, seus servos, só resta a disciplina da vontade nas mútuas reações de aglutinação entre o que ousamos sonhar, de longe, para a nossa existência, e o que ele determinou, de perto, para protagonizarmos.

Nesta ocasião, não desejo realizar aqui uma apologia à predestinação. Outros teólogos talvez se dediquem a isso com muito mais propriedade do que eu poderia fazê-lo. Mas quero contemplar o determinismo conseqüente da história, como elementos inevitáveis, soprados por ventos fortes e sustentados por mãos poderosas.

Quero me permitir essa visão porque ela me (des)acelera, me tranqüiliza, acalma as batidas do meu coração, baixa o meu metabolismo, traz repouso para minha alma cansada de tantas guerras.
E entre o mistério e a contemplação, ainda encontro ocasião para render a Ele toda honra e toda glória.

Quero glorificar o Deus “da plenitude dos tempos.” Há uma plenitude dos tempos em todos os atos permitidos por Deus, cuja execução não pode anteceder ou preceder o momento que Ele escolheu, desde antes da fundação do mundo.

Se esse momento é ou não ideal para você, se esse acontecimento é ou não agradável à sua alma, não importa tanto quanto o impacto da revelação de que tudo quanto está acontecendo, tem acontecido, ou vai acontecer à sua vida, foi permitido e cronometrado com a infalibilidade do Deus da plenitude dos tempos.

Se você está sorrindo, este é o tempo de sorrir. Se você está prosperando, este é o tempo de prosperar. Se você está descansando, este é o tempo de descansar. Mas se você está chorando, este é o tempo de chorar. Se você está experimentando todo tipo de tribulações, este é o tempo de suportar a disciplina de Deus, em nome de Jesus.

No calendário de Deus há uma programação que não atrasa e nem adianta, e ainda se cumpre, religiosamente, segundo objetivos eternos. Não há espaço para o acaso, a sorte, a coincidência, ou qualquer “carta de baralho do destino”, porque “sabemos que todas as coisas contribuem conjuntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados por seu decreto.”( Romanos 8:28).

Pascal, em um de seus momentos de angústia existencial, desabafou, dizendo: “Quantos reinos nos ignoram!” Mas o Salmo 139 fala de um reino cujo Rei conhece o mais profundo do nosso ser. Fala de um imenso, contínuo e ininterrupto desvendar-se aos olhos atentos de um Rei que tudo vê:
“Senhor, tu me sondas e me conheces.
Tu conheces o meu assentar e o meu levantar: de longe entendes o meu pensamento.
Cercas o meu andar e o meu deitar e conheces todos os meus caminhos.
Sem que haja uma palavra na minha língua, eis que, ó Senhor, tudo conheces.
Tu me cercaste em volta e puseste sobre mim a tua mão. Tal ciência é para mim maravilhosíssima: tão alta que não a posso atingir.
Para onde me irei do teu Espírito, ou para onde fugirei da tua face? Se subir ao céu, tu aí estás; se fizer no Seol a minha cama, eis que tu ali estás também.
Se tomar as asas da alva, se habitar nas extremidades do mar, até ali a tua mão me guiará e a tua destra me susterá.
Se disser: decerto que as trevas me encobrirão, então a noite será luz à roda de mim.
Nem ainda as trevas me escondem de ti, mas a noite resplandece como o dia; as trevas e a luz são para ti a mesma coisa....”

Em meio às dores, às dificuldades, às provações, podemos experimentar a espécie de paz que excede todo o entendimento e a certeza interior de que “Deus não nos ignora.”

Em situações de extrema fragilidade emocional, corremos o risco de dramatizar o cenário e supervalorizar o drama pessoal, a ponto de nos privarmos, eventual e momentaneamente, da visão de êxtase da glória de Deus.

Nessas circunstâncias, é possível que avaliemos a eternidade pela ótica desfavorável do momento, desviando a visão do céu, enquanto prosseguimos caminhando para lá. Tudo isso é mera fraqueza humana. Mas perder de vista a onisciência, a onipresença e a onipotência de Deus é banalizar o Divino. Do alto de seus atributos inevitáveis, nem isso Deus ignora...



texto: Ana Maria Ribas Bernardelli

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